Nosso escritório tem certa preferência pela holding como instrumento de planejamento sucessório. Neste artigo conto o porquê.
I. Introdução.
Como muitos sabem e é mais visível publicamente, atuo como advogado contencioso em direito sucessório, direito imobiliário e proteção do patrimônio. Outra área de atuação, no entanto, ocupa grande parte do meu tempo. É a atuação consultiva em direitos sucessórios e direito imobiliário voltado à proteção patrimonial.
Vem crescendo o número de consultas de clientes que buscam um plano de sucessão patrimonial que garanta um processo seguro de sucessão, ao mesmo tempo em que garanta a administração sobre o patrimônio.
Alguns clientes, tocados por perda humana ocorrida durante a Pandemia Covid-19, perda esta que os fez vivenciar a odisseia jurídica do inventário judicial, perceberam a necessidade de um prévio planejamento sucessório para suas empresas e para seu patrimônio pessoal.
Outros clientes somam outra preocupação que não só a necessidade de planejamento. Pretendem realizar um projeto de sucessão, mas são muito sinceros em me dizer que as aventuras amorosas de alguns filhos mais incautos tem gerado muita insegurança na transmissão imediata do patrimônio.
Em paralelo às consultas sobre a sucessão, recebo em meu escritório muitos questionamentos sobre os mecanismos jurídicos de proteção do patrimônio pessoal, contra dívidas das empresas, principalmente em eventual crise financeira.
A mim parece que ambas as preocupações soam muito legítimas. Seja aquela atrelado a sucessão, seja aquela atrelada a proteção patrimonial, dado que nosso patrimônio é o resultado materializado de tantos anos dedicados ao trabalho.
II. Holding Como Instrumento de Planejamento Sucessório e Proteção Patrimonial.
De imediato respondo que é, sim, possível a realização de um planejamento sucessório seguro e; é, sim, possível fazer um plano de proteção patrimonial e; que, é possível unificá-los em um único processo legal e legítimo.
No entanto, este planejamento deve ser realizado por meios diversos daquelas hipóteses mais óbvias.
A realidade inexorável é que a Lei e o Poder Judiciário não conseguem acompanhar a velocidade e o dinamismo do mundo dos negócios. As formas de sucessão comuns e ordinárias previstas em nossa legislação, como a doação com usufruto, o testamento e o inventário puro e simples, não conseguem entregar um resultado satisfatório e rápido àquele titular de maior patrimônio e quotas/ações de sociedades empresárias. Estas formas mais comuns que mencionei, também não permitem o controle administrativo e financeiro deste patrimônio após iniciada a sucessão.
Em razão das necessidades surgidas, os operadores mais experientes que atuam no direito empresarial, no direito das famílias e sucessões passaram criar soluções mais práticas e efetivas.
Duas dessas soluções que propomos para o planejamento sucessório e proteção patrimonial são as já suficientemente experimentadas sociedades holdings e sociedade civil imobiliária.
Das holdings vê-se falar mais. Primeiro, infelizmente por certa confusão de conceitos, pois alguns menos versados tratam toda e qualquer sociedade empresária como holding, ainda que a sociedade não seja titular de quotas ou ações de outras (conceito que, neste passo, seria equivocado). Em segundo, fala-se mais das holdings porque de fato o leque de resultados possíveis com ela é maior do que aqueles da sociedade civil imobiliária.
Abaixo, passo tratar das vantagens práticas da holding, o que pode aplicar-se, também às sociedades civis imobiliárias.
III. A utilidade Real das Holdings no Planejamento Sucessório.
O nosso direito atual prevê formas antigas de disposição do nosso patrimônio em vida, seja por doações, seja por testamento.
As doações, feitas ou não com usufruto, geram um problema de irrevogabilidade; o patrimônio doado, de regra não volta ao doador pelo simples arrependimento e estão sujeitas a hipóteses de anulações (judicialização), se não observados algumas anuências.
Os testamentos, por sua vez, esbarram em muitos limites formais e, pior, dependem de inventário judicial.
Falando em abertura de inventário, é comum aos advogados das áreas sucessórias (área que opera inventários), especialmente em comarcas maiores, enfrentarem tempo de 60 a 90 dias até a nomeação de um inventariante para administrar a herança. Necessitar do tempo de 1 ano para conseguir a autorização para venda de algum bem, especialmente quando há herdeiros menores de idade, não mais causa estarrecimento aos operadores.
Visando evitar estas dificuldades, visualizou-se a possibilidade de realizar o planejamento sucessório mediante constituição de uma sociedade, normalmente uma holding, que será titular das quotas sociais das empresas do casal, dos bens imóveis ou móveis dos sócios.
Constituída esta sociedade, com capital social integralizado pelos bens, passa-se proceder a cessão de quotas aos sucessores, mantendo-se a administração desta sociedade e o usufruto das quotas nas mãos dos patriarcas.
Desse modo, em caso de falecimento de qualquer familiar, fica garantida a administração da sociedade, o recebimento dos lucros e a livre disposição de bens e independentemente do processo de inventário.
Abaixo, esclareço outras das vantagens do planejamento sucessório via holding.
III. I. Vantagens Operacionais da Holdings no Direito das Sucessões:
Na ausência de planejamento sucessório, com o falecimento do titular dos bens o patrimônio fica “engessado” e dependente de nomeação de inventariante.
Por disposição de Lei, mesmo as procurações ficam automaticamente revogadas com o falecimento, e a movimentação bancária fica prejudicada, pois depende da nomeação e compromisso de um inventariante.
A venda de móveis ou imóveis depende de procedimento ainda mais demorado e burocrático que é a autorização judicial expressa, mesmo que a negociação imobiliária 5seja o objeto social da empresa.
De modo que a constituição de uma sociedade holding confere uma vantagem elevada, pois evita aquele “engessamento” patrimonial ocorrido no inventário tradicional.
III. II. Eficiência Tributária das Sociedades Holgings:
Além de enormes vantagens de ordem prática, há vantagens financeiras.
Isso porque os custos do inventário, mesmo em Cartório, são elevadíssimos. No inventário, as despesas são calculadas com base no valor mercadológico do patrimônio. Entre honorários advocatícios, custas judiciais, emolumentos extrajudiciais e impostos (ITCMD), estima-se que os custos atingem entre 15% a 25% sobre o valor mercadológico dos bens.
Outro aspecto importante de frisar é que o cálculo do Imposto Causa Mortis se faz sobre o valor mercadológico dos bens. A média nacional do Imposto Causa Mortis é de 4%. Em alguns Estados já se elevou o ITCMD para o teto nacional de 8%, permitido pela Resolução 09 do Senado Federal. Há tendência legislativa para elevação deste teto para 16%.
Por fim, há elevadíssima vantagem na tributação da renda proveniente dos bens imóveis. O imposto de renda incidente na pessoa física 27,5%, contra pelo menos a metade na pessoa jurídica.
III. III. Holdings e a Segurança nas Disposições Sucessórias:
A constituição da holding permite a elaboração de uma série de cláusulas que garantem a administração do patrimônio familiar e a segurança jurídica dos patriarcas. Tais disposições não são possíveis nas formas tradicionais de sucessão, por testamento ou na doação de bens para pessoa física.
Como já dito anteriormente, o testamento tem limites na parte disponível da herança. Exige longo processo de inventário. As doações com usufruto têm um limite muito estreito e, de regra, também causam judicialização. A holding tem sido a preferida para o planejamento sucessório porque concede imensa liberdade na formulação de suas cláusulas.
Tudo porque, na constituição das holdings pode-se adotar o regime jurídico das sociedades anônimas, com eleição de cláusulas como:- cláusula da incomunicabilidade das quotas (para o caso de casamento, mesmo em comunhão de bens); cláusula de reserva de usufruto; impenhorabilidade (por dívidas pessoais ou das pessoas jurídicas); inalienabilidade (proibição de transferir as quotas ou ações); reversão (retorno das quotas ao doador em caso de falecimento do beneficiário); cláusula de administração permanente; cláusula de reserva de direitos políticos ou de votação; criação de golden share (ações com poderes exclusivos de nomeação de administrador) ou; cláusula de call (direito de adquirir de volta as quotas doadas por preço determinado).
IV. A Eficácia das Holdings na Proteção Patrimonial:
Muito embora não seja correto afirmar que as holdings blindem absolutamente o patrimônio, na prática realmente constitui reforçada proteção aos bens pessoais ou familiares, principalmente contra dívidas cíveis, trabalhistas e tributárias das empresas.
Essa proteção é muito visível na medida em que a penhora de bens da sociedade holding já não é mais procedimento simples e habitual como é a penhora de bens titularizados pela pessoa física.
Por exemplo, para penhora de bens pertencentes às holdings é necessária instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica, regido pelas novas disposições da Lei de Liberdade Econômica e que tramita em autos apartados, assim suspendendo as execuções.
Nas dívidas civis, exige prova cabal de abuso ou confusão patrimonial, o que na prática é burocrático e trabalhoso.
Em regra, tais procedimentos têm sido uma barreira aos advogados menos habilidosos com a matéria da desconsideração.
V. Conclusões.
A necessidade de proteção patrimonial e realização de um planejamento sucessório é uma necessidade real de quem possui patrimônio. No entanto, as formas tradicionais não viabilizam um leque muito grande de possibilidades.
Uma forma experimentada é a constituição de holdings familiares, que permite uma maior disposição do patrimônio, garante a administração dos bens pelos patriarcas e, também fazer retornar o patrimônio em caso de necessidade.
A constituição das sociedades holdings também permite uma maior proteção do patrimônio dos sócios em caso de dívidas civis, tributárias ou trabalhistas.
Aconselha-se a constituição da holding com o assessoramento de um advogado especialista, pois a matéria é de alta complexidade e refoge ao entendimento comum, mesmo aos operadores jurídicos.
Pedro Rafael Thomé Pacheco é advogado inscrito na OAB/PR sob n.º 45.618. Tem atuação nas áreas de direito sucessório, inventários, planejamento sucessório, direito imobiliário e direito privado para empresas.
É sócio do escritório Martins & Thomé Pacheco Advocacia (OAB/PR 5.532), fundado há 10 anos. O escritório tem especialização em direito sucessório, inventários e planejamento sucessório, direito de família para proteção patrimonial, direito imobiliário e direito empresarial e trabalhista empresarial (proteção patrimonial para empresas).